Era segunda, às vezes parece que todos os dias são segundas, mas não são. Depois que ela se foi, havia uma paz perturbadora, digo, paz não, silêncio, um silêncio perturbador e retumbante em todas as coisas que via. Nem sempre morreremos ao lado do nosso grande amor, os enredos de filmes de romance são falaciosos e cruéis. Às vezes, não se chora no fim do filme, mas sim no meio. Às vezes, a morte rouba suas lágrimas. Essa tal morte (que não veste preto e nem usa foice) não conhece a palavra piedade, cautela, altruísmo, não conhece nada, ela é simples; simplesmente mata e não te dá a chance de dizer tchau. Tenho amigos, o Franklin, por exemplo, vive me falando sobre sair, viver a vida (se é que essa frase é possível), mas é algo tortuoso. Prefiro respeitar a memória dela.
A eternidade é de vidro e, para me lembrar disso, acendo, toda noite, uma vela. Esqueço, propositalmente, de apagá-la e já totalizam quarenta e duas. Estão em ordem, enfileiradas, imóveis, o fogo dança parado, fala mudo, vê através do nada. Não gritam, não reclamam, não vivem. Se comprometem todos os dias com a ideia de me lembrar que faz muito tempo que sinto mortais saudades. Nem o vento da janela apaga-as, parecem determinadas com o seu propósito.
Alguém toca a campainha “malditos, não sabem respeitar o luto de um homem.” Com ódio, levanto da cadeira para ver quem é. Uma tontura inesperada invade minha visão e meus movimentos. Desequilibrado, esbarro em uma das velas que cai espalhando fogo por toda a sala. Vi naquelas labaredas a chance de me redescobrir, de entender que aqui nada serei, de, novamente, ter o espelho como amigo. Agradeci cada fagulha e nem senti a dor enquanto as chamas iam comendo toda minha pele, pelo contrário, apesar do calor e da minha alma em brasa, só uma frase invadia minha mente: “estou chegando”.