
Uma das características de hollywood é idolatrar diretores que tem assinatura nos seus filmes. Conseguir enxergar que tal filme é de tal diretor ou que tem elementos peculiares transforma as críticas em um “vale a pena ver de novo” distribuídas em blogs e canais de youtube. Quando Jordan Peele afirmou que não pretendia ter brancos protagonizando seus filmes, muito se falou de como isso soaria se fosse ao contrário. A questão é que um desses super diretores com assinatura própria tem como característica nunca ter tido um negro protagonizando seus filmes. Falaremos hoje sobre Martin Scorsese.
Táxi Driver, Os Infiltrados, O Irlandês, com certeza alguma hora você já assistiu alguma obra desse senhor. É bem verdade que ele ficou mais na mídia, nos últimos tempos, por ter afirmado que filmes de super-herói não são cinema, são mero entretenimento. Acho que é o tipo de opinião que justifica muito do entendimento desse texto. Listei os 10 primeiros filmes de Martin, me baseando nas notas do IMDB. Vale a ressalva que, desses dez filmes, o mais bem ranqueado tem nota 8,5 e o menor tem nota 7,5. O que significa que pro IMDB seus filmes são muito bons.
Tiremos desse papo Os Bons Companheiros, Cassino, O Irlandês, Lobo de Wall Street e Touro Indomável, pois são baseados em fatos reais e, normalmente em cinebiografias, preserva-se a maior quantidade possível de características dos personagens principais. A interrogação que pode vir diante desses filmes é: Por que só contar a história de pessoas brancas? Essas são cenas para um próximo episódio.
Ilha do Medo apresenta personagens que em suas épocas transitavam por lugares muito específicos. Na década de 50, ter um negro como investigador era algo muito distante. Estamos falando da década em que ainda havia linchamento de pessoas negras nas ruas só pelo fato delas serem negras.
Os Infiltrados se passa em Boston, uma das cidades mais racistas do Estados Unidos por ser uma cidade portuária com forte influencia irlandesa. O filme ainda retrata uma máfia com ascendência italiana e policiais locais. Em uma cidade em que se demorou tanto para juntar negros e brancos numa só escola, ter policiais negros em posição de destaque seria ficção demais para o nosso pobre Scorsese.
Depois de Horas é o filme de Martin Scorsese que poderia facilmente ter sido feito pelo Woody Allen. E, vale a ressalva, Woody Allen é o tipo de diretor que fez um musical sobre gangsters do Harlem e não usou atores negros. Então… Depois de Horas é só mais uma evidência da limitação racial desses grandes diretores hollywoodianos.

Chegamos aos dois filmes que poderiam ter negros como protagonistas; Táxi Driver e Rei da Comédia. E não por que eles apresentam dois protagonistas fracassados, mas por representarem pessoas esmagadas por uma sociedade que te vê deitado no chão, cospe e ainda chuta a sua barriga. Táxi Driver e Rei da Comédia conversam muito com a ideia do que fazer quando se é socialmente invisível. Imaginem a força que esses filmes ganhariam com protagonistas negros? Não estou dizendo que eles ficariam melhores ou piores, mas ganhariam um contexto, ganhariam entrelinhas que não existem da forma como foram concebidos. Mas o que levou aos protagonistas a serem brancos? Sei lá, a predileção pro DeNiro, talvez, como foi algumas vezes por DiCaprio, mas será que é só isso?
Afirmo e reafirmo a importância da arte como ferramenta para que todas as histórias sejam contadas. É necessário, é prazeroso, é fundamental a pluralidade de gêneros, cores, formas, ideologias e etc. para que os espectadores entendam que num mundo global, todas as pessoas podem coexistir. Para não parecer chato, vou indicar o meu filme predileto do Scorsese; Cabo do Medo. Ele nem entrou na lista por causa do critério lá do IMDB. Ah…… ele também poderia ser protagonizado por um negro, mas não é. #WakandaForever
Por que não é mimimi?
A cultura pop é formada por mentes criativas e suas grandes ideias. Produtores, diretores, executivos, show runners… apesar do termo “cultura pop” nos levar a imaginar algo intangível, todo esse espaço é formado por pessoas. Essas pessoas precisam ter a ciência de que vivemos em um mundo global e plural. Não adianta só alguns serem, não há como estar satisfeito em um mundo em que alguém sinta-se à vontade com a ideia de que existe algum promotor de arte que não se veja na obrigação de promover um espaço em que todas as vozes possam ser ouvidas. Eu não quero Martin Scorsece só com atores e atrizes brancas e Jordan Peele só com atores e atrizes negras, quero diretores que possam trabalhar com todos os tipos de profissionais. A arte não tem e nunca teve um caráter limitador. Então… não é mimimi.